segunda-feira, 9 de julho de 2018

Nas Páginas: A Casa dos Espíritos - Isabel Allende



Gostaria de fazer algo especial para A Casa dos Espíritos, no entanto, não consegui pensar em algo que me agradasse ou que tivesse à altura do livro, por isso, corri o risco de me tornar um fantasma ao deixar esse assunto pendente. Isso não poderia ter acontecido! A Casa dos Espíritos é o livro de que mais gostei dos últimos tempos e até recebeu uma estrelinha de favorito (está ao lado do intocável A História Sem Fim). Então, para não deixar esse livro incrível sem um texto aqui, decidi escrever algo mais simples sobre ele. É melhor algo mais simples do que nada, né?

Pois vamos lá. Em A Casa dos Espíritos acompanhamos três gerações de uma família e são as mulheres que conduzem o viés dessa história (embora o patriarca Esteban Trueba também tenha sua devida parte). Em primeiro lugar, temos Clara del Valle que é a matriarca e o poderoso alicerce de toda a história. É ao redor dela que a mágica dessa história acontece. Clara é uma mulher forte, mas que vive dividida entre esse mundo em que vivemos encarcerados e um mundo que nos é raramente permitido vislumbrar. São vários os momentos em que Clara nos brinda com sua excentricidade e faz das páginas desse livro muito mais do que o que está escrito nelas. Arrisco-me a dizer que ela é a imperdoável culpada por grande parte da atmosfera onírica e improvável que tanto me fascinou. Em seguida, surge o protagonismo da segunda del Valle, Blanca, a querida filha de Clara. Blanca é uma figura mais terrena. Ela não está tão conectada com o sobrenatural quanto sua mãe, no entanto, percebemos nela traços dos mistérios da família del Valle. No caso dela, eles se manifestam sutilmente. Blanca vive várias frustrações amorosas (talvez todas se resumam em apenas uma) e tem um destino sinuoso pelo qual ela parece caminhar sem saber ao certo o que está fazendo (ao contrário de sua mãe que parece saber todos os detalhes do que acontecerá). Considero Blanca, a del Valle com quem menos me conectei, embora seja impossível não se sensibilizar com os infortúnios que quase esmagam todas as suas esperanças. Por fim, como última del Valle a aparecer na história, temos Alba, neta de Clara. Alba tem os cabelos verdes como os de sua tia-avó Rosa e leva consigo o idealismo de sua bisavó, Nívea. Ela cresce em um país caótico que busca se livrar de um governo de direita opressor, do qual seu avô, Esteban, faz parte. Alba é destemida, prática e luta pelo que acredita, pelos que ama, e não poderia deixar de se envolver nesse embate político. Recai sobre Alba, o peso do passado de sua família e é por meio dela que o possivelmente detestável Esteban encontrará alguma redenção e uma porção de paz.

Gosto de pensar nas mulheres dessas três gerações como facetas de um único ser. Clara representaria o lado espiritual. Sua ligação com o místico, seus poderes de clarividência, a telecinese e mesmo sua presença que parece pouco pertencer a esse plano terrestre. Clara, para mim, é a conexão com algo maior, com a magia. Percebemos isso na própria história, fica evidente que os elementos fantásticos quase desaparecem depois da morte de Clara, depois que ela decide morrer. Clara é o espírito. Na outra faceta, temos Blanca que representa o corpo. Blanca se entrega desde jovem a uma paixão desenfreada que ultrapassa todos os obstáculos que o mundo (pode-se entender que, quando digo mundo, estou querendo dizer Esteban Trueba) impõe a esse amor, a essa paixão. Blanca se satisfaz com a paixão, com o amor terreno, o amor dos homens (ou de um homem só). Ela é simples, está ali para viver o mundo, seus desejos e anseios são diretos. Por isso, digo que Blanca é o corpo. Por fim, completando essa trindade, temos Alba que ocupa a faceta da razão, da mente. Alba é aquela que racionaliza a história de sua família; que, na medida do possível, repreende seu avô; é aquela que luta por seus ideais; é aquela que não só enxerga problemas, mas que também busca soluções. Assim, Alba representa a mente. As três gerações del Valle: espírito, corpo e mente.

Obviamente estou sendo injusto com esse livro, já que enxergo nele centenas de outros pontos e questões que poderiam render reflexões muito interessantes, como o golpe militar Chileno que dilacerou o país, as relações dos vários personagens que permeiam as vidas dos del Valle (eu preciso mencionar a Férula Trueba, Barrabás, Nicolas e Jaime, os Pedros Garcia, são muitos e incríveis), as aventuras sobrenaturais de Clara, os desalentos amorosos. É um livro maravilhoso. Sou muito grato por ter lido essa história e agora  uma parte do meu coração pertence à Isabel Allende e à família Del Valle.



Título: A Casa dos Espíritos
Título Original: La Casa de los Espiritus
Autora: Isabel Allende
Tradução: Carlos Martins Pereira
Editora: Bertrand Brasil
Páginas: 448
Ano: 1982
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